Discurso do Líder do Hezbollah, Sayyed Hassan Nasrallah, sobre os últimos acontecimentos nacionais e regionais, na terça feira 29 de setembro de 2020.
O Secretário Geral do Hezbollah, Sayyed Hassan Nasrallah, pediu ao presidente francês Emmanuel Macron para revisar seu discurso sobre o Líbano, na forma e no conteúdo, acusando-o de ter minado a dignidade nacional libanesa.
“Sempre acolhemos a iniciativa francesa, mas a intimidação não deve continuar. Recusamos que o Presidente Emmanuel Macron se comporte como o governador do Líbano”, disse Sayyed Nasrallah na terça-feira, 29 de setembro, durante um discurso transmitido pelo canal Al Manar. Ele discutiu especialmente em detalhes as reais razões pelas quais as tentativas do primeiro-ministro indicado, Moustafa Adib, de formar um gabinete ministerial fracassaram.
O líder do Hezbollah explicou como o clube dos quatro ex-primeiros-ministros libaneses, incluindo Saad Hariri, queriam anular a opinião das forças políticas de peso no Líbano, na designação de pastas ministeriais, ao querer impor aos libaneses um governo de fato consumado, sob pena de ameaças de sanções e bloqueio. Tudo sem qualquer vínculo com o texto da iniciativa francesa.
Alerta contra as intenções dos EUA de ressuscitar células do Daesh no Líbano e na região, o chefe do Hezbollah, nesse contexto, acusou os Estados Unidos e a Arábia Saudita de terem frustrado a iniciativa francesa para tirar o Líbano de sua crise.
Em seu discurso, Sayyed Nasrallah negou as acusações do primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu sobre a existência de um depósito de armas perto do Aeroporto Internacional de Beirute. “Netanyahu é um mentiroso, e vamos provar isso ao mundo”, disse ele. Apelando à assessoria de imprensa do Hezbollah para organizar uma visita ao local designado por Netanyahu.
Os principais pontos do discurso:
Em primeiro lugar, gostaria de apresentar as minhas condolências ao povo do Kuwait, ao seu governo, ao seu parlamento e ao Príncipe Herdeiro pelo falecimento do emir do Kuwait, Sheikh Sabah AL Ahmad AL Sabah. Os libaneses jamais esquecerão o papel do Kuwait e de seu emir no fim da guerra civil no Líbano, nem sua posição em relação à agressão israelense contra o Líbano em 2006 e sua contribuição para a reconstrução do Líbano, nem sua posição firme em face da pressão sobre os países do Golfo para normalizar suas relações com o inimigo sionista. Rogo a Deus que lhe dê misericórdia.
Células takfiristas no norte do Líbano
Em segundo lugar, quero abordar a situação da segurança no norte do Líbano. O que aconteceu na localidade de Kaftoune e os confrontos entre grupos terroristas com o exército libanês e as forças de segurança.
Saudamos os esforços que levaram à descoberta dessas células e estendemos nossas condolências às famílias dos soldados do exército martirizados. A descoberta desses pequenos grupos, armados com cinturões explosivos, foguetes RBG e cartuchos de morteiro, prova que se preparavam para um grande ataque. Eu avisei há um mês contra as intenções americanas de reativar elementos do Daesh no Iraque e em nossa região.
Na verdade, após o assassinato do general Qassem Soleimani e Abu Mahdi AL Mohandes, e após a resolução do parlamento iraquiano pedindo a retirada das forças americanas do Iraque, os Estados Unidos ressuscitaram o pequeno grupo Daesh no Iraque para justificar sua presença.
Como o Líbano faz parte da região, peço vigilância. A investigação revelou que os membros dos pequenos grupos mortos ou presos no norte pertencem ao Daesh. Quando os Estados Unidos se sentem num impasse, eles recorrem a tais atos.
O estado de alerta israelense no Sul continua
Terceiro, tenho algo a dizer sobre a situação na fronteira Sul. O exército de ocupação ainda está em alerta, aguardando nossa resposta (ao martírio de um lutador do Hezbollah por um ataque israelense à Síria). Eles não ousam se mover na fronteira. É o mais longo estado de alerta israelense desde 1948.
A nova mentira de Netanyahu
Outro ponto a respeito do assunto israelense. Em seu discurso à ONU, Netanyahu procurou incitar o povo libanês contra o Hezbollah, citando um local onde se usa armazenar mísseis entre Beirute e o subúrbio do Hezbollah, próximo a um posto de gasolina. Netanyahu é um mentiroso e vamos provar isso. A acessória de imprensa do Hezbollah convidara, após meu discurso, a mídia local e estrangeira a entrar nesta instalação, para que todos descubram a mentira de Netanyahu. E se quiserem ir antes do final do meu discurso, podem. O Hezbollah não armazena mísseis no porto ou perto de um posto de gasolina.
Um governo de fatos consumados ou sanções
No nível político local, gostaria de explicar à opinião pública libanesa o que aconteceu em conexão com as negociações do governo. Depois da explosão de 04 de agosto e da renúncia do governo, houve duas reuniões dos presidentes libanês e francês. Macron propôs sua iniciativa de apelo à rápida formação de um governo.
Os blocos parlamentares concordaram em nomear um candidato para o cargo de primeiro-ministro. Durante este período, o clube dos quatro ex-Primeiros Ministros (Fouad Siniora, Nagib Mikati, Tammam Salam e Saad Hariri) se reuniu e apresentou uma lista de três candidatos, incluindo Moustafa Adib. Para facilitar a rápida formação do governo, não emitimos quaisquer condições e aceitamos a nomeação do Sr. Adib.
Mas, após a sua nomeação, parece que Adib foi convidado a não discutir a formação do governo com os parlamentares, ou mesmo com o chefe de Estado, que é o principal parceiro na formação do governo. Os franceses devem saber onde cometeram um erro, em particular retirando do Presidente da República uma das suas prerrogativas mais importantes.
Aquele que negocia conosco sobre a formação do governo não foi o Primeiro Ministro designado Mostafa Adib, mas Saad Hariri. Ele apenas nos informou sobre o número de ministros do governo (14 ministros), do estabelecimento do princípio de rotação de pastas ministeriais, e que a distribuição e nomeação de ministros serão pelo clube dos ex primeiro ministros e não pelos blocos parlamentares eleitos pela maioria do povo libanês.
Rejeitamos o que nos foi apresentado porque constitui um perigo para o país. Eles querem impor novos costumes contrários à Constituição e ao princípio da democracia exigidos pelo presidente francês. De 2005 até os dias de hoje, o Primeiro-Ministro e as bancadas parlamentares concordaram sobre as pastas e a nomeação de candidatos ao governo.
No final do atraso de 15 dias, o clube dos quatro ex primeiro ministros nem sequerem discutiram com o Chefe de Estado, nem admitiram que os blocos majoritários no parlamento nomeassem os seus representantes. Eles queriam impor novos costumes, violando a constituição, em favor de partidos que não representam a maioria no parlamento. Enquanto avisa das consequências desastrosas em caso de objeção.
Em seguida, nos dirigimos aos franceses e perguntamos se a iniciativa do presidente Macron incluía as propostas feitas pelo clube dos ex-PMs. Disseram-nos: Não.
Na verdade, a iniciativa francesa não define o número de ministros, nem o princípio de rotação, nem que as forças políticas não devem contribuir para a distribuição de pastas e a nomeação de ministros. Estávamos comprometidos com a nomeação do ministro xiita para o cargo do Ministério das Finanças, já que esse cargo se relaciona à tomada de decisões. Discutirei isso em detalhes em outra ocasião. Em um ponto houve claramente uma tentativa de impor um governo de fato aos libaneses.
Fomos convidados, no último mês, a entregar o país ao clube do ex-PM, sem discussão. Enquanto eles representam apenas parte dos libaneses. E não a maioria. Aqueles que quiseram impor seu governo e marcar pontos políticos que não conseguiram conquistar nos últimos anos são os que fizeram a iniciativa francesa fracassar. A forma como a abordagem se desenvolveu é inaceitável no Líbano. É uma perda de tempo quem quer que seja seu patrocinador ou defensor.
Por muito tempo, dissemos que a razão da nossa presença no governo era proteger a resistência, e até agora continua assim, proteger a resistência. Para evitar, entre outras coisas, repetir o que aconteceu com o governo em 05 de maio de 2008. Naquela época, o governo havia tomado uma perigosa decisão, por instigação do americano-israelense-saudita, de pressionar por um confronto entre a resistência e o exército.
Mas hoje, depois da turbulência econômica e financeira e em todos os níveis por que passou o Líbano, verifica-se que não podemos em nenhum caso estar ausentes no governo, não por medo apenas pela resistência , mas pelo Líbano e pelo que resta dele.
Não podemos aprovar a formação de um gabinete que aceite sem negociar os termos do Fundo Monetário Internacional (FMI) ou venda os ativos do Estado sob o pretexto de pagar a dívida dos depósitos bancários das pessoas, e tememos que isso aconteça. Não podemos mais permitir que ninguém forme o governo baseando na delicadeza e sensibilidade da situação econômica no Líbano. Não temos o direito de temer um governo que poderia vender propriedades do Estado sob pressão financeira e recorrer à privatização e a impostos mais altos para cobrir o déficit?
Macron não deve se comportar como o governador do Líbano
Em relação à entrevista coletiva do presidente Macron que atribuiu o fracasso de sua iniciativa aos partidos políticos, repito o que dissemos aos seus representantes, a iniciativa recomendou a ex-chefes de governo para formar o governo e nomear ministros?
A posição em conjunto do Amal e Hezbollah evitou que o Líbano caísse de mal a pior. Esperamos que todos os libaneses cooperem para salvar o caos no Líbano.
O Senhor Macron precisa descobrir qual partido que pretende controlar o país e excluir as outras forças políticas, graças ao seu apoio. Métodos que usam intimidação não funcionam no Líbano. Isso é uma perda do tempo.
O senhor Macron acusou-nos de aterrorizar os libaneses, mas na realidade foi o clube dos ex-PMs que os aterrorizou e ameaçou com sanções os blocos parlamentares e as forças políticas.
Os quatro ex-parlamentares governaram nos últimos 15 anos e são os grandes responsáveis pela crise no Líbano. Eles não são os únicos responsáveis, mas assumem a maior responsabilidade. Que lógica dita, que devemos dar a eles as chaves do país?
Não aceitamos ser chamados de traidores, nem que sejamos acusados de estarmos envolvidos em corrupção. Condenamos esse tipo de conversa. Se os franceses têm arquivos de corrupção incriminando ministros do Hezbollah, deixe-os levá-los à justiça.
Além disso, quais são as promessas que não foram cumpridas, por nossa parte, no que diz respeito à formação do governo. Foi o Macron quem pediu primeiro a formação de um governo de unidade nacional. Mas parece que desistiu, provavelmente sob a pressão dos Estados Unidos e da Arábia Saudita.
Por que um partido (Mostaqbal) pode escolher todos os candidatos do governo, enquanto as outras forças políticas são deixadas de fora?
Nós, o Presidente francês, somos os únicos conhecidos entre os nossos amigos e inimigos pelo apego às nossas promessas e pelos sacrifícios que fazemos para cumpri-las.
Você está nos pedindo para fazer a escolha entre a democracia ou o pior. Mas porque escolhemos a democracia que nos recusamos a permitir que uma maioria parlamentar se curve diante de uma minoria.
Além disso, não fomos nós que travamos guerra contra Israel, mas foram os sionistas que atacaram o Líbano e confiscaram suas terras. E então, não fomos à Síria para lutar contra os civis, mas fomos lá – a pedido do governo sírio – para lutar contra os terroristas, a quem o senhor mesmo se encontra la’ pela mesma razão. Não fazemos parte da classe corrupta e não aceitamos ninguém que se dirija a nós assim.
Aceitamos a nomeação do Sr. Adib incondicionalmente e de boa fé para facilitar a formação do governo, porém, ceder e devolver o país, é outra questão.
Senhor Macron, pode perguntar à sua embaixada o quanto os meios de comunicação nos insultam dia e noite, se tivessem medo de nós não podiam abrir a boca. Por outro lado, é nos países árabes, que são seus amigos, que não se atrevam a postar um tweet criticando um rei ou um príncipe.
Além disso, todos tem que saber que o Irã não interfere nos assuntos internos dos libaneses e as decisões são dos próprios cidadãos.
Continuando a minha palavra com Macron, se quer saber quem frustrou a sua iniciativa, olhe para os americanos, com a sua política de sanções, e para o discurso do Rei Salman da Arábia na ONU.
Em termos de forma, rejeitamos e condenamos essa linguagem arrogante. Saudamos a visita do Sr. Macron e sua iniciativa como um amigo que ama o Líbano e quer ajudá-lo a superar a crise, mas não se comportar como um comissário ou promotor. Esperamos que ele revise o conteúdo e a forma de seu discurso. Saudamos a iniciativa francesa, mas não aceitamos que se transforme em mandato ou supervisão.
Estamos sempre prontos para o diálogo com os franceses e com todos os componentes políticos libaneses. Mas denunciamos as intimidações exercidas no último mês. O tom e a abordagem devem mudar, caso contrário, nenhum resultado pode ser esperado. Respeito e dignidade pelas pessoas são padrões importantes nas negociações. As palavras do presidente francês são um atentado à dignidade nacional, o que é inaceitável. É nestas condições que aderimos à iniciativa francesa. E estamos abertos a todos os componentes libaneses para que o Líbano supere o pior e avance para o melhor.
Padronização: a aposta nas pessoas
Uma palavra final sobre os acordos de paz. Saudamos o povo do Bahrein que desafiou o regime. Também saudamos os Ulemas, incluindo o xeque Issa Qassem em sua liderança, e as várias instituições que se manifestaram contra qualquer normalização com a entidade sionista. Apostamos no povo do Bahrein que, apesar do rapto dos seus filhos, saiu às ruas para manifestar a sua desaprovação à escolha do seu regime. Saudamos também o povo da Tunísia e da Argélia. Apelamos ao povo sudanês e aos partidos para que trabalhem para evitar a normalização dos acordos de paz.
Source: AlManar